quinta-feira, 19 de abril de 2012

Parte 10

19 de abril
19:00


Tive pesadelos estranhos esta noite.


Foi uma noite tranquila, provavelmente a mais tranquila desde que chegamos aqui. Todos dormiram bem, e acordaram descansados. Eu já não posso dizer o mesmo. Sonhei que estava no velho prédio principal. Ele estava inteiro, e eu sabia, no sonho, que fazia pouco tempo que o presídio havia sido fechado.


Eu andava pelos corredores, que estavam escuros e cheirando à mofo. Não havia ninguém comigo, e eu estava com medo. Lá fora, uma chuva repleta de raios e trovões caía. O vento gemia suavemente, passando por entre grades e portas, fazendo com que o lugar se tornasse ainda mais assustador.


Não parecia haver nenhum ser vivo ali, somente eu. Caminhava lentamente, olhando de soslaio para dentro das celas através das janelas engradadas. Nada se movia lá dentro, apenas eu e o vento.


O silêncio era sepulcral, o que me fez pular de susto quando algo caiu atrás de mim, no fundo do corredor.


Com receio me virei, e quando meus olhos percorreram o escuro corredor até o final, me ofertaram uma visão que, creio, nunca esquecerei.


Próxima à parede, caminhando em minha direção a passos lentos, uma mulher de idade indefinida me observava por entre os cabelos compridos, louros. Seu olhar era negro como a noite, demoníaco, cheio de ódio. Dos lábios exalava um leve sorriso irônico, apavorante. Vestia uma roupa antiga, de saias longas, branca, porém suja. Sua pele era acinzentada, como se a morte tivesse lhe visitado há algum tempo.


Neste momento senti um medo indescritível. Resolvi correr e, num impulso, entrei em uma das celas, cuja porta estava aberta. Fechei a porta, como se isso pudesse evitar a entrada daquele ser.


Quando me virei, meu sangue gelou! pendurados a uma viga no teto, enforcados, estavam todos os meus companheiros!


Um trovão iluminava este sonho sinistro quando acordei, banhado em suor e aos gritos. Os rapazes me acudiram, mas eu não lhes contei do sonho até a manhã seguinte. Não consegui mais pegar no sono o resto da noite, fiquei rolando na minha cama.


Levantei ainda cansado, e acho que vou ficar assim por um tempo. Tomei uns bons goles de café e saímos. No caminho contei-lhes o sonho, e ficaram meio assustados, com exceção de Renan, que sempre se faz de durão, mas que no fundo aposto que acredita em tudo.


Fomos em direção ao prédio principal, o mesmo de meu pesadelo. Tive receio de entrar lá, mas não podia falar isso pro pessoal. Respirei fundo e entramos no grande pátio.


De lá, comecei minha narrativa. 


O FIM DA PRISÃO


Como eu contei anteriormente, o tempo em que a prisão funcionou correu, em partes, bem. Alguns registros de historias estranhas, visões, desaparecimentos, entre outros. Mas nada muito significante.


Até aquela noite. 


Naquela noite, dois guardas faziam a ronda, como é de se esperar. Como ocorre frequentemente neste lugar, em certas épocas do ano, chovia torrencialmente, e relâmpagos iluminavam esporadicamente o local.


Os dois caras andavam juntos, conversando despreocupadamente, pois fazia um tempo que nada significante ocorria no lugar, enquanto os presos dormiam.


Mas um barulho os chamou a atenção. Um som leve, vindo do fundo do corredor...


Quando olharam para trás, viram uma mulher assustadora vindo em sua direção.


(como no meu pesadelo)


Um trovão mais forte iluminou o local, e, neste relance, eles viram todos mortos.


Tentaram gritar, caídos no chão, mas a voz não saía. As pernas não obedeciam, e eles ficaram ali, imóveis, observando aquela criatura se aproximando, enquanto olhos mortos os observavam de dentro das celas.


Os dois foram encontrados no dia seguinte. Um deles estava morto, e o outro, dizem, sobreviveu apenas alguns dias, o suficiente para contar o ocorrido, e dizer que olhou a morte nos olhos.


Todos os presos estavam mortos. Alguns tinham os pulsos cortados, outros estavam pendurados em cordas... Deduziram suicídio coletivo, mas a historia conta outra coisa.


Por fim, resolveram fechar o local, pois a maioria dos funcionários não queriam mais ficar. Acho que encontraram outro lugar para mandar os miseráveis, e as portas ficaram fechadas, até a brilhante ideia do hospício surgir. Daí as coisas ficaram ainda mais complicadas.


Mas eu não estava mais com fôlego para contar nada. Pedi ao pessoal que apenas dessemos uma volta por aí e fossemos embora. Estava cansado e um pouco abalado, por conta do pesadelo. Ainda não conhecia os detalhes da historia do presídio, mas sonhei com algo assustadoramente parecido.


-*-*-*-


Depois das filmagens no prédio, fomos dar uma olhada nas construções dos arredores. Depois de um tempo caminhando, pensando na vida, passamos por um prédio de apenas um andar e de porte médio, localizado a uma certa distância dos outros, em meio a algumas arvores, aos pés da mata. Aquele local era a antiga capela, aberta nos tempos do presídio, mas que voltou a funcionar com o hospício. Deve ter historias interessantes, vou procurar nos papeis. Queremos visitá-la amanhã.


Agora vou tomar umas cervejas e tentar dormir. Quem sabe eu não sonhe com a capela, ou ninguém vira sonambulo, ou a casa não crie vida. Espero poder descansar.

















Nenhum comentário:

Postar um comentário